Soneto n° 13

Ó grande escritor, dono do destino, 
Narre-me, sem usar caneta ou tinta. 
Para corrigir, não para que minta, 
Suplico, da borracha faça meu hino. 

Não uma vida com cinzel desenhada. 
Em todo ato, refazer cada trecho, 
Todas linhas, para cada desfecho. 
Múltiplas vezes, por toda toada. 

E ao final, sem madeira talhada. 
Apenas outro rascunho borrado, 
Combustível para qualquer fornalha. 

Para quê, todo sempre ser lembrada? 
Se interessa a esse único brocado, 
Tanto vitórias, quanto toda falha. 

Paraísos Artificiais

A vida passava leve,
Assim como descia o espumante batido com morango.
Não era champanhe, nem uma taça, mas a doçura justificava.


Sentado com a coberta sobre os pés.
Os livros haviam se tornado peças decorativas, 
Tal qual a televisão, nada além de um quadro negro empoeirado.
A tela escura com pontos brancos, mimese do céu estrelado.


As lágrimas escorriam, uma de cada vez, sem choro ou careta.
Talvez fosse o fim do outono, o teor alcoólico, saudosismo ou ilusão.
Sinceridade e artificialidade de mãos dadas, noite à tarde.


"Amamos a vida não porque estejamos habituados à vida, mas ao amor"

 Já me dispus a acreditar em deuses que soubessem dançar.

Mas a leveza não está nos movimentos circulares da bailarina.

Ela apenas é treinada para parecer flutuar.

Deuses amam.

E fazem preguiça.

Entre a cama e as estrelas.

Entre o futuro e o passado.

Amam preguiçosamente.

Granularidade

Seria a fluidez do tempo uma ilusão do momento presente?
Na memória, o tempo é granular.
Como fatos caindo da parte superior de uma ampulheta,
Memórias se atritam, colidem.
Cada briga,
Cada paixão,
Um grão,
Indivisível.


Como verde no vermelho

"Nunca o mesmo homem,
nunca o mesmo rio".

Nunca o mesmo amor, 
Nem o mesmo amante, nem o mesmo amado.

Qual o fixo, o imutável, 
além da própria impermanência? 

Lembranças fluidas, 
percepção enviesada,
ciclicamente eclipsados.

Haveria eternidade prolongada no tempo,
sem autoengano,
sem completa submissão,
sem morte breve?

As posições mudam,
A entropia aumenta.
Sobra o brilho verde destes olhos vermelhos.