O Condenado

Domingo, poucos minutos para a segunda-feira. Minutos que se arrastavam na noite mais fria do ano.
Já sentia seus dedos congelarem quando resolveu desligar o computador.
Passara as últimas doze horas conectado a grande rede, procurando um sentido para a vida, ou simplesmente alguém com quem pudesse conversar.
Mas a dificuldade era dantesca: nenhuma alma virtual parecia disposta a falar sobre algo além de sexo, dos problemas, ou fazer aquelas típica perguntas "tc d onde? qual a idade? tem namorada? faz oq da vida?"
Tão simplista, tão fútil, tão humano. Será que os homens já haviam vivido épocas diferentes?
Em sua incessante busca, deduziu que alguém que habitasse seus sonhos, alguém além da caverna, nunca estaria ali, há essa hora, em frente a uma máquina.
Para se proteger do frio colocou um sobretudo, e pôs-se a andar.
Não sabia que somente percebia aquilo que queria ver.
Andava pela rua, na sua tradicional marcha, sem olhar para trás, tão rápido que mesmo se o destino estivesse correndo atrás dele, não seria possível alcançá-lo.

Tudo fechado, lugares inóspitos, um ambiente tétrico.
Já não mais agüentava a rua quando decidiu pular a grande barreira de sua vida, escalou com muita garra o muro para entrar no cemitério.
Lá sentia-se em casa, longe dos ferozes olhos dos vivos, próximo à paz da morte.
Rezava toda noite para pedir a Deus que a morte fosse o fim, nada de outra vida, queria deixar de sofrer.
E os minutos continuavam a arrastar-se, e, a cada vez mais, tinha certeza de que sua alma gêmea era mais corajosa, que ela já estaria debaixo de sete palmos de terra.

O sol começava a expulsar a lua do céu. O início da claridade incomodava.
Aquele espaço, em breve, abrir-se-ia para os vivos, e, de fato, não gostaria de incomodá-los com sua fúnebre presença.

Próximo de casa, é abordado por três jovens armados.
Reage ao assalto e com um soco repentino e quebra o nariz do menor deles.
Fecha os olhos.
A espera da dor da bala não era mais longa do que cada minuto de sua vida.
Mas quando se deu conta, sentia uma dor muito maior do que a imaginada.
Os três corriam para longe, condenando-o ao maior de todos os sofrimentos.


-2000-

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